quarta-feira, setembro 26, 2007

Mais perto, outra pessoa, o equívoco, espontaneidade de não ser.


O som calcorreia a madeira. Será o ar em vibração, que os ouvidos humanos entendem como um conjunto de frequências agradáveis. Em primeira análise são audíveis, apenas. Quando posso, o ar que sai – resquícios do processo de alimentação das células – é dedicado a alguém, é como se eu me desse, sob a forma de vida, a alguém. Assim surgem as músicas de dança (danças tão antigas como a memória que se tem delas), aquelas que um dia serão (ou já são) partilhadas. As músicas entranham-se pelos ouvidos e fundem-se nos músculos, nos ossos dos dançarinos. Por alguma irracionalidade, sente-se tudo no peito. Quando sou eu e a flauta, danço com o mundo inteiro, ao mesmo tempo, em osmose sonora. Penso no Lá da melodia acompanhado pelo acorde RéM, e estou onde quero estar: num campo verde, a correr como um miúdo que acabou de sair da escola ansioso por chegar a casa e não ter de pensar, só estar e ser. Não te conheço, mas estive a vida toda à tua espera. Um dia libertaste-me, com as tuas mãos, da prisão onde um flautista acaba sempre, com as mãos geladas, numa noite solitária. Acabei encarcerado por ti, na masmorra dos teus olhos, que não me vêem.